As placas gráficas lançadas em 2020 prometeram revolucionar o mercado com performance superior à geração anterior por apenas uma fração do preço. Não foi, por isso, surpreendente que se tornassem em autênticos sucessos de venda. Contudo, a elevada procura, aliada ao contexto pandémico, levou a uma escassez de stock global.
Mas será que isso justifica o aumento estratosférico do preço das placas gráficas e o porquê de nunca estarem disponíveis? Vamos descobrir…
Placas Gráficas Revolucionárias e… Baratas?
Para entendermos o aumento de preços, temos primeiro de entender o porquê da popularidade das gráficas lançadas em 2020.
Antes dos lançamentos de 2020, as placas gráficas da Nvidia mais recentes no mercado eram baseadas em tecnologia com 2 anos — a GeForce RTX série 20, de 2018. As gráficas da AMD eram mais recentes (as Radeon RX 5000 foram lançadas em meados de 2019), mas em termos de performance eram semelhantes às da Nvidia (quando os drivers queriam funcionar) e sem RTX.
Verdade seja dita, o lançamento de quaisquer novas placas gráficas ia sempre ser um sucesso para os entusiastas. No entanto, o anúncio das RTX 30 superou as expectativas e conseguiu capturar a atenção de um público mais generalizado.
De acordo com a Nvidia, aquando do anúncio da nova série de gráficas, a RTX 3070 (o modelo mais fraco daquele evento) tinha uma performance superior à RTX 2080S, uma das placas de topo da série 20, lançada em resposta às mais recentes RX 5000 da AMD.
Mas o mais notável não foi necessariamente este boost de performance. Enquanto que a RTX 2080S tinha sido lançada com o preço de 699 dólares, a versão base da RTX 3070 iria custar 499 dólares.
Com 699 dólares era possível comprar a RTX 3080, em tudo superior à geração anterior. Depois seguiu-se o lançamento da AMD, que, surpreendentemente, conseguiu rivalizar em termos de performance com as gráficas da Nvidia, e com preços de entrada semelhantes.
Quarentena, Teletrabalho e a Necessidade de Entretenimento
Como os historiadores hão de notar (e como nós bem sabemos), em março de 2020 o mundo parou pela primeira vez e as pessoas precisaram de algo para lhes ocupar o tempo. Alguns dedicaram-se ao fabrico de pão, outros a projetos artísticos e houve aqueles que se viraram para o gaming.
As vendas de computadores dispararam e bateram recordes de 10 anos. É verdade que muitas destas vendas foram de portáteis e provavelmente motivadas pela necessidade de trabalhar remotamente, mas ainda assim houve muita gente a jogar — em março a plataforma Steam bateu recordes: mais de 23 milhões de utilizadores online em simultâneo, com 7,25 milhões em jogo.
Claro que nos primeiros tempos da pandemia não havia stocks de RTX 30 nem de RX 6000 para esgotar, mas nem toda a gente que queria ter comprado um PC para gaming conseguiu comprá-lo durante o primeiro confinamento.
Os Problemas de Produção
Saltemos do primeiro confinamento para o período após as novas placas gráficas terem sido lançadas. Como seria de esperar, a primeira remessa das novas gráficas esgotou imediatamente.
Nada de novo. Bastava apenas esperar que chegasse um novo fornecimento ao mercado… certo?
Infelizmente, as coisas não iam ser assim tão simples. Não havia oferta para responder à procura. Entusiastas, gamers ocasionais e os recém-chegados tinham todos interesse nas novas gráficas e o mercado não conseguia fazer o produto chegar a todos.
Porquê?
Porque não havia (e à data ainda não há) chips suficientes para fazer as placas gráficas.
Como este artigo da ExtremeTech explica, existe uma clara preferência no mercado para utilizar wafers de 200mm — e a pandemia aumentou a necessidade da população de adquirir produtos que utilizam este tipo de semicondutores. O problema foi que as fábricas também não estavam preparadas para o aumento da demanda, o que resultou em quebras do stock de silício.
Ou seja, devido a problemas da cadeia de produção, o stock das novas gráficas já era reduzido. Mas ainda havia algo mais a ajudar à falta de stock…
Os Scalpers e os Miners
Situação: sabes que a loja X vai ter stock de gráficas num determinado dia. Passas o dia com a página da loja aberta a carregar no F5, com esperança de conseguires apanhar uma das placas gráficas. A certa altura, reparas que as gráficas estão finalmente em stock, mas, quando estás prestes a finalizar a compra, reparas que já não há uma única gráfica. O que é que aconteceu?
Provavelmente deparaste-te com um dos muitos bots utilizados pelos scalpers, pessoas que compram grandes quantidades de produto de modo a criar uma escassez artificial para que possam revender o produto a um preço mais elevado.
Esta prática gerou mais de 22 milhões de dólares em vendas só no eBay. Isto significa que mesmo quando havia stock, não havia stock — estava todo nas mãos dos scalpers.
Os revendedores tomaram algumas ações para impedir esta prática (como uma melhor deteção de bots ou um limite de unidades por cliente), mas ainda assim esta continua a existir.
Mas os scalpers não eram (e não são) os únicos a querer açambarcar o stock das placas gráficas. O crescimento exponencial do valor de algumas criptomoedas levou à tentativa de obter essas moedas através do mining — e para isso são necessárias placas gráficas.
Já em 2017 aconteceu algo semelhante. Os miners de Bitcoin acabaram com o stock de placas gráficas em vários mercados.
O Aumento dos Preços das Placas Gráficas
Diz a lei da oferta e da procura que uma procura superior à oferta leva ao aumento dos preços. Claro que isto tem muitas nuances e raramente é assim tão simples. Quanto muito, a falta de stock poderia levar a loja X a aumentar os preços, mesmo que o preço do revendedor continuasse igual.
Acontece que, no caso do aumento das gráficas, o aumento do preço partiu por parte do revendedor e não das lojas. Os motivos são variados e já passámos por alguns deles, como os problemas da cadeia de produção, mas existe um que talvez seja responsável pelos preços galopantes.
Na guerra económica EUA-China, encabeçada por Donald Trump, estabeleceu-se que em janeiro de 2021 algumas das exceções de imposto de importação iriam terminar. Uma dessas exceções era relativa aos componentes dos computadores. Terminadas as exceções, iriam existir aumentos nos preços de gráficas, motherboards, processadores e muito mais.
As placas gráficas importadas da China para os Estados Unidos sofreram um aumento de 25%. Os fornecedores, por sua vez, decidiram passar este custo para os consumidores.
O problema é que o mercado Norte-Americano é que acaba por ditar os preços praticados no mundo. Mesmo que os produtos não passem pelos Estados Unidos para chegar à Europa (muitos deles, no entanto, passam), os revendedores acabam por praticar preços semelhantes nas duas regiões. Ainda não se sabe se os preços vão voltar ao normal. É difícil de prever. Por enquanto, espera-se que a escassez continue durante o futuro próximo.